Sentados no chão e em círculo, conversávamos, eu e meus alunos, sobre gêneros e estilos da literatura dramática: o clássico, o moderno, o popular, o erudito, enfim discutíamos estruturas, características, mas o papo não agradava de jeito nenhum. Mas uma vez confirmei que o que eles curtem mesmo é ação. Chamei a atenção para o fato de que existem vários ritimos na linguagem dramática e que vários são os temas e formas, toquei nos traços da comédia, da tragédia e nada.
- Que nada Beto! Tem que ter ação!
- Ação! Porrada!
Sem querer ser puritano, nem colocar o bem e o mal na balança dos contos de fada, viajamos no discurso do cinema americano. Para um grupo de quinze adolescentes, é fascinante brincar de mocinho e bandido. O problema é identificar o inimigo.
A minha tentativa de falar dos ritmos da poesia em "Vidas Secas" ou do colorido no "Selvagem da Motocicleta" era quase em vão. Como chamar de lixo a caríssima produção da estética moderna da violência "Vandamianica"?
Fomos algumas vezes ao teatro, assistimos a alguns filmes, fizemos algumas leituras, na tentativa de escolher um tema para uma montagem, mas não havia um interesse coletivo. Por ocasião de um laboratório em sala de aula, onde trabalhávamos a questão da cidadania da criança e do adolescente, teatralizamos letras de música, foi quando pintou o "clima" e optamos pela questão da violência. Mergulhamos aí.
Lemos um texto de Gian Francesco Guarnieri para a televisão: "Pivete". Tem uma trama bem feita, envolvendo crianças, adolescentes e adultos, os esquemas com as drogas e consequentemente criminalidade. Os alunos estão dispostos a adaptarem a estória para o teatro. Ufa, eles se envolveram! Eu também!
Agora é outra frase. Tenho procurado escutar mais, perguntar mais, levantar questões. "O teatro não tem que ter as respostas e não tem que resolver a questão da violência - tem é que provocar debate. Não ao transe virtual da modernidade.
Afinal ela é tão presente. Não é apenas a violência das telas, dos morros ou das cidades. Não. Ela está aqui na sala de aula, dentro de casa... Você não sabe mais se está vendo ou vivendo a cena. A violência é externa, e você está dentro dela. A sedução de matar ou morrer. Qual é a referência? É uma enrascada fatal.
Todo dia rola uma história, novas tribos e novos personagens. No baile, no beco, na escadaria, no futebol a amenaça é constante e natural.
-"Não vacile não, se não eu vou güentá a tua óia."
Beto, me empresta esse revólver.
- Mas é de espoleta. Pra que você...
- E então, dá pra meter umas paradas.
- Cavaleiro é o terror!
- Os Coelhos é o terror!
- O Alto José do Pinho é o terror!
- Quem é o matador?
E eu pergunto, será que esses anjos são tão demônios assim?Ou é apenas um charme?
educação popular
, Brasil, Pernambuco
Beto é educador, trabalha no CTC (Centro de Trabalho e Cultura), em Pernambuco e é integrante do Coletivo de Educadores de Jovens e Adultos daquele estado.
Através do insentivo à produção e leitura de fichas de capitalização de experiências pedagógicas, a rede BAM pretende favorecer a um processo de formação continuada junto a coletivos de educadores de jovens e adultos (hoje, existentes nos estados do Rio de Janeiro e Pernambuco). Está apoiado numa metodologia que valoriza a autoria e promove a interação entre educadores de diferentes contextos.
Texto original
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