Meu nome é Ana Cláudia, sou educadora popular, em Barra Mansa. Vários caminhos me levaram a essa experiência e várias experiências me levaram a refletir, uma delas foi exatamente com uma aluna do meu curso de alfabetização de adultos.
Um dia, voltando para casa encontrei-me com essa aluna, Helena, no ponto de ônibus. Como era sábado, aumentaram os intervalos nos horários dos ônibus, e estava demorando muito. De repente a D. Helena se revoltou e começou a falar comigo:
"- Puxa vida, Ana Cláudia, já passaram vários ônibus. Já passou o Colônia, Vila Maria, Vila Ursulino, Km 4, Santa Maria e Rialto. Só não passou o nosso que é o Sinderlândia.
Na hora eu fiquei tão abismada que limitei-me a concordar. Abismada exatamente porque D. Helena é analfabeta, está no curso, mas não consegue ler muita coisa.
Minha curiosidade não parou aí: na segunda-feira, cheguei na sala e fui direto à D. Helena: - D. Helena, como foi que a senhora conseguiu identificar os ônibus, já que todos são iguais? Ela simplesmente me respondeu:
"- Ah, Ana Cláudia, as letras sozinhas eu conheço, não sei ler quando estão juntas, mas sozinhas é fácil. Por exemplo: todo ônibus que tem "V" é Vila Ursulino e se for "M" é Vila Maria.
O que tem "C" na frente é Colônia. O que tem "R" é Rialto. O que tem "S" complica porque pode ser Santa Maria 2 ou Siderlândia, mas se tem o número "2" é Santa Maria "2", porque o que tem "4" é Km 4.
Depois dessa exibição de memória ágil fui obrigada a recolher à minha insignificância e começar a ensiná-los a ler letreiros de ônibus, pelo menos aqueles que têm acesso.
Mas o que me deixou pensativa, foi como a memória de D. Helena é lógica, e será quanto tempo que ela demorou para chegar àquelas conclusões? Uma pessoa com uma vivência dessa, deve ser chamada de analfabeta? Ou nós letrados, devemos rever o conceito de analfabetismo?
éducation populaire
, Brésil, Barra Mansa, Rio de Janeiro
Ana Cláudia é educadora popular na cidade de Barra Mansa, Município do Rio de Janeiro.
Através do insentivo à produção e leitura de fichas de capitalização de experiências pedagógicas, a rede BAM pretende favorecer a um processo de formação continuada junto a coletivos de educadores de jovens e adultos (hoje, existentes nos estados do Rio de Janeiro e Pernambuco). Está apoiado numa metodologia que valoriza a autoria e promove a interação entre educadores de diferentes contextos.
Récit d’expérience ; Texte original
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