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Educação a distância

Uma experiência de educação inclusiva para surdos na universidade brasileira

Marcio VIEIRA DE SOUZA, Solange Cristina da Silva, Rose Clér Estivalete BECHE

04 / 2009

A comunidade de surdos há muito tempo vem discutindo e lutando por sua participação efetiva na educação. Nessa luta, no Brasil, os surdos puderam contar com Universidade do Estado de Santa Catarina, UDESC, por intermédio do Centro de Educação à Distância – CEAD, que sensível à sua mobilização em favor da luta pelo direito à educação, abriu em 2002, vaga para esse grupo no Curso de Pedagogia à Distância com Habilitação em Séries Iniciais e Educação Infantil. Esta experiência, retratada pelo olhar de professores da Educação a Distância, traz uma ação de democratização do ensino e respeito às diferenças.

A educação à distância é um processo de ensino-aprendizagem que cada vez mais vem ganhando espaço nas universidades e nas diversas instituições públicas e privadas, possibilitando, assim, a democratização do ensino. Essa proposta de educação surgiu para contemplar uma demanda de pessoas que, por vários motivos, tais como moradia em municípios isolados dos centros educacionais, dificuldade de locomoção, necessidades educativas diferenciadas, não conseguiam freqüentar o ensino presencial.

O Curso de Pedagogia a Distância da UDESC, objetivando democratizar o ensino em Santa Catarina, constitui um Curso com duração de quatro anos na modalidade semi-presencial, a qual contém momentos presenciais do professor de cada disciplina com o tutor, que faz a mediação entre o aluno e o conhecimento, bem como com os alunos; e momentos a distância, os quais utilizam da tecnologia de comunicação e informação como computador, materiais impressos, vídeos e a ambiente virtual de aprendizagem.

Em 2002, compartilhando da luta da comunidade surda pelo cumprimento de seu direito à educação, estendeu este Curso de Pedagogia a uma turma de alunos composta por trinta e oito alunos, sendo trinta e um surdos e sete ouvintes que desenvolvem trabalhos com surdos. O desafio de oferecer a esse grupo uma educação de qualidade estava no que se refere a metodologia, no como fazer para oportunizar uma aprendizagem significativa à esse grupo. Ao longo do Curso podemos contar com a parceria de instituições e dos próprios alunos para vencer esse desafio. Nesse sentido foram feitas adaptações no Curso oferecido para os ouvintes, objetivando respeitar a forma de aprender do aluno surdo.

Considerando a experiência visual dos alunos surdos, o curso foi realizado em Língua Brasileira de Sinais – LIBRAS. Para desenvolver este trabalho havia dois tutores bilíngües e um tutor que atuava juntamente com o intérprete de língua de sinais para os encontros presenciais. Cabiam às tutoras bilíngües a mediação entre o professor da disciplina e o aluno, bem como a responsabilidade pela concretização da comunicação bidirecional e discussão do conteúdo das disciplinas. Semanalmente eles tinham dois encontros com esses profissionais para acrescentar discussões ao processo ensino-aprendizagem e o acompanhamento direto desse processo, bem como contribuíam na construção de caminhos facilitadores visando a aprendizagem e buscando a autonomia dos alunos.

Dentro do contexto ficava a cargo da tutora, como facilitadoras e mediadoras da aprendizagem, auxiliar na organização e planejamento dos estudos aluno, bem como por meio de estratégias visuais de ensino-aprendizagem adequadas aos alunos surdos, acompanha-los no seu processo de forma a auxiliá-los na superação das dificuldades. E, para isso, utilizavam-se então desses dois encontros, sendo um encontro de discussão sobre o conteúdo do material didático e um horário de plantão pedagógico para tirar possíveis dúvidas sobre o conteúdo da disciplina.

Compondo, ainda, a metodologia usada nesse Curso havia um encontro presencial com o/a professor/a da disciplina, no qual as possíveis dúvidas eram respondidas, cabendo às tutoras acompanhar o/a professor/a, auxiliando na comunicação e no esclarecimento das dúvidas. Para este encontro havia, também, a utilização de intérprete e uma orientação prévia aos professores sobre a metodologia e a dinâmica a ser utilizada.

As avaliações das disciplinas, inicialmente eram feitas em LIBRAS, gravadas e traduzidas pela intérprete, de acordo com a escolha do aluno. Posteriormente, esta passou, por uma decisão dos próprios alunos, a serem oferecidas somente escritas. A aplicação das mesmas ficavam a cargo das tutoras com o auxílio, e necessário, de intérprete.

As atribuições do/a Intérprete de língua de sinais, neste Curso, não se restringia somente a interpretar os encontros tutoriais e presencias, sendo sua presença importante também nos momentos de discussão sobre os encaminhamentos específicos do Curso, nas Reuniões Administrativas e Pedagógicas, na qual são organizados os conteúdos e as aulas pelos/as tutores/as. Além dessas atividades, o intérprete participava da produção de vídeos dos conteúdos das disciplinas na versão LIBRAS, que serviam de complemento aos estudos dos cadernos pedagógicos (impressos) pelos alunos.

Ainda, dentro dessa premissa do respeito as diferenças, foram feitas adaptações curriculares neste Curso, no qual foram incluídos estudos independentes como a História dos Surdos, Português Instrumental, Língua Brasileira de Sinais - LIBRAS de maneira que possibilitasse qualidade lingüística de nossos futuros professores e, também, conteúdos relevantes para a educação de surdos.

Dentre os desafios experiênciados no desenvolvimento deste Curso, a avaliação teve destaque. A proposta do curso baseia-se na teoria histórico-cultural que prevê a avaliação como acompanhamento e participação em todo o processo. Nesse sentido, de forma contínua e gradativa, este processo é considerado a partir dos trabalhos realizados pelos alunos e sua participação, os quais são avaliados pelas tutoras, bem como, das avaliações específicas dos conteúdos de cada disciplina, que são corrigidas por professores-corretores ou pelos professores das disciplinas. Entretanto, há uma obrigatoriedade normativa de a avaliação ser presencial. Assim, considerando o diferencial lingüístico desses alunos, que tem a LIBRAS (Língua Brasileira de Sinais) como primeira língua, solicitou-se aos professores das disciplinas que mantivessem a mesma estrutura das avaliações realizadas para as outras turmas, mas que a linguagem utilizada fosse mais objetiva, ou seja, mais diretos nas questões. Considerando o aspecto lingüístico deste grupo, mas também garantindo a escrita em português já que o português ficou como segunda língua para esses alunos e necessitava ser aprimorado, propõe-se que a primeira prova fosse escrita e se os alunos não conseguissem ser aprovados nesta, eles poderiam fazer uma outra prova com as questões objetivas escritas e a questão dissertativa poderia ser em Língua de Sinais, filmada e transcrita pela intérprete. Esta opção inicialmente oferecida durou pouco tempo, pois logo no início do Curso os alunos preferiam escrever as suas respostas. Esta escolha permitiu evidenciar o crescente domínio da língua portuguesa por parte desses alunos.

Este trabalho de quatro anos, desenvolvido mediante os desafios metodológicos que se apresentaram, teve como resultado a constituição de um Curso de qualidade visando consolidar o respeito e a valorização das diferenças, bem como a formatura, em março de 2006, de trinta e dois surdos e sete ouvintes que trabalhavam com surdos. Esta proposta de inclusão contagiou a Universidade como um todo, culminando na construção do LEdI – Laboratório de Educação Inclusiva - CEAD/UDESC, propondo uma iniciativa mais ampla de construção de acessibilidade por meio de ações comprometidas no âmbito do ensino, da pesquisa e da extensão. E, atualmente a contratação de um professor efetivo de Língua Brasileira de Sinais, disciplina essa oferecida a diversos cursos desta Universidade. Numa ação coletiva esse trabalho fomenta o desenvolvimento de políticas publicas visando a inclusão na Universidade.

Mots-clés

éducation, droit à l’éducation, accès à l’éducation, enseignement supérieur, formation à distance


, Brésil

Commentaire

A Educação a Distância no Brasil tem crescido de forma vertiginosa na última década. Ainda existem resistências à aplicação das novas tecnologias de comunicação na educação do país, realizada por uma parcela da academia, de educadores brasileiros e da elite que temem a perda da qualidade e do controle do processo educacional. Porém, com a necessidade de ampliação de conhecimento em um país de dimensões continentais, carente de recursos econômicos e sociais, juntamente com o barateamento das novas tecnologias de comunicação e a “sede por saber” de uma grande parcela da população trabalhadora, tem contribuído para o fenômeno de massificação e ampliação da educação a distância no Brasil. Neste processo estão ocorrendo várias experiências ricas em inclusão digital, educacional e principalmente social, como é o caso desta experiência realizada com surdos pela Universidade Estadual de Santa Catarina e relatada pelo olhar desses educadores.

Notes

Veja também a ficha: “A Educação a Distância contribuindo para Inclusão dos Cegos” sobre experiência semelhante.

Source

Universidade do Vale de Itajai (Programa de Mestrado em Gestão de Políticas Públicas da UNIVALI-SC (PMGPP-UNIVALI)) - Rua Uruguai, 458- Itajaí- Santa Catarina, BRASIL CEP: 88302-202 - Brésil - www.univali.br

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