07 / 1995
Nos dias 8 e 9 de julho realizou-se no Centro Educacional Sagrado Coraçãode Jesus, no Alto da Boa Vista, o V Seminário de Alfabetização de Jovens e Adultos do Rio de Janeiro. Participaram deste encontro doze pessoas com diferentes inserções no campo da educação de jovens e adultos, todas ligadas ao Coletivo do Rio de Janeiro.
A temática do encontro, escolhida previamente pelo grupo, se propunha a refletir sobre as práticas que compõem o coletivo Rio, tomando como ponto de partida as seguintes questões: método/metodologia e o perfil do jovem/adulto analfabeto.
No tocante à questão metodológica partimos dos depoimentos de cada uma das experiências presentes no encontro, com o objetivo de compreender como cada um de nós está construindo sua prática no dia-a-dia e na sala de aula. Os depoimentos foram seguidos de debates, trocas de experiências e de um apanhado histórico da questão, que nos ajudou a identificar as diferentes linhas metodológicas e os diferentes métodos utilizados na prática da alfabetização de adultos. Livres de qualquer pretensão em definir o "melhor método" ou a "linha metodológica mais adequada", chegamos, a meu ver, mais uma vez, à conclusão de que o que nos une em torno de uma proposta de "autoformação"é o reconhecimento e a valorização do "princípio da diferença". Segundo este princípio, são diferentes as leituras e abordagens que fazemos da realidade e da nossa intervenção enquanto educadores, são diferentes as realidades sócio-econômicas e culturais que caracterizam as relações entre nós e nossos alunos. Assim, ao lidar com a questão método/metodologia estamos de acordo que o que buscamos não são as "receitas" ou "verdades prontas e acabadas"mas, instrumentos que nos permitam debruçar sobre os princípios comuns que norteiam a nossa prática, acreditando que o caminho da explicitação e da aceitação das diferenças pode ser também o mesmo caminho que construirá uma abordagem nova e contextualizada de nossas intervenções.
É claro que o "princípio da diferença" tem as suas implicações. Aconstumados que estamos em buscar o consenso, somos levados a investir timidamente nos confrontos como se, a partir deles, não estivéssemos mais aptos para uma leitura plural e eficaz da complexa realidade que nos cerca. E, nesse sentido, somos levados a confrontar conhecimentos e abordagens distintas e nos antenamos, cada vez mais, para todas as contribuições que podem vir das diversas áreas de conhecimento e de todas as manifestações possíveis desse conhecimento, enquanto leitura e interpretação da realidade. Isso inclui, sem dúvida, a contribuição dos alunos nesse processo que pretende ir além da simples prática pedagógica.
Ao nos dedicarmos a uma reflexão sobre o perfil do aluno jovem/adulto, cada vez mais empobrecido e excluído da sociedade, não podemos deixar de ter em mente as contribuições e questionamentos da filosofia, da antropologia, da sociologia, etc.
O que nos faz, por exemplo, entrar nos domínios da ética para tentarmos compreender a crise de valores em que estamos metidos? Crise que refuta e inverte valores, questiona profundamente a nossa prática e a de toda escola - que sempre apareceu como um dos principais veículos de estabelecimento e manutenção dos valores éticos e morais.
Numa experiência que o fez conviver durante dez meses com a realidade de uma favela carioca, o jornalista e escritor Zuenir Ventura diz que, em se tratando de juventude pobre, até mesmo a pergunta está errada: não é "por que tantos jovens estão no mundo do tráfico ou da criminalidade? Mas, por que tantos ainda não estão?" Essa poderia ser uma inversão possível a que chegaríamos depois dos vários depoimentos que ouvimos no V seminário do Rio. Se, de um lado, estão os jovens e adolescentes que freqüentam nossos cursos noturnos em Imbariê, na Rocinha e mesmo na Zona Sul e no asfalto carioca, como parte de um grupo de resistentes, do outro lado estão os apelos do narcotráfico, para onde foram os que "sucumbiram". São jovens soldados ocupados e muito bem remunerados, experimentando uma espécie de glória "que pode tornar épica uma vida medíocre."
"Estudar para quê?" - diz uma aluna do curso noturno de uma escola pública da Urca - Zona Sul do Rio. Na verdade ela já havia confessado à sua professora que seu projeto era simplesmente o de tornar-se "mulher de bandido".
O que fazer diante dessa realidade? Não sabemos. O que sabemos é que não podemos simplesmente aceitar o consensual "discurso da impotência", como se nada mais pudesse ser feito. Como se a escola não pudesse atender a esse quase apelo "dos que ainda resistem".
education, popular education
, Brazil
Através do insentivo à produção e leitura de fichas de capitalização de experiências pedagógicas, a rede BAM pretende favorecer a um processo de formação continuada junto a coletivos de educadores de jovens e adultos (hoje, existentes nos estados do Rio de Janeiro e Pernambuco). Está apoiado numa metodologia que valoriza a autoria e promove a interação entre educadores de diferentes contextos.
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