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dialogues, proposals, stories for global citizenship

Radio Cabocla : solidariedade e integraçao comunitaria

Cristiana TRAMONTE

03 / 1993

A Radio Cabocla, da comunidade do Morro da Penitenciaria, em Florianopolis emite, todos os sabados as noticias e avisos da comunidade,consiste num alto-falante instalado na casa de "seu" Lori e tem prestado servicos comunitarios de todo tipo: desde oferecimento de musicas ,ate prestacao de socorro em situacoes de tragedia ou calamidade - falecimentos, vizinhos que necessitam doacao de sangue,oracao conjunta da comunidade,etc. Seu Lori e operario da construcao civil, antigo morador do bairro, hoje conselheiro da Associacao de Moradores e um dos idealizadores e realizadores da Radio Cabocla.

A Radio, na verdade, e o resultado e o motor de um longo processo de organizacao da comunidade. Segundo Seu Lori,tudo começou com os "grupos de base" da Igreja Progressista em 1982: nas celebracoes começa a participar mais gente e acontecer em espacos abertos,(casas de moradores e pracas). No ano seguinte, cria-se a "Comissao da Terra" para garantir a posse da terra a comunidade. Em l986, nasce a Associacao para lutar por agua, luz, pavimentacao, escadaria (para vencer a inclinacao do morro)e posse da terra. O trabalho resultou numa padaria, feira, marcenaria, creche, forno para artesanato em barro e a Radio Cabocla, compromisso assumido na campanha. Apesar da dificuldade de leitura e escrita que Seu Lori expressa abertamente, isso nao impediu que ele assumisse levar adiante a promessa da chapa, contando com a ajuda de Paulinho (9 anos, encarregado de ler e redigir as mensagens e fazer o oferecimento das musicas)e Marcia, 14 anos, que substitui a mae, antiga organizadora da radio. "Tudo e feito ao vivo, ainda nao temos condicao de fazer a gravacao dos programas. A gente nao tem torre, mas tem planos para isso", declara Seu Joao Batista, tambem operario da construcao civil , presidente da Associacao e como Seu Lori e grande parte da populacao da comunidade, oriundo do planalto serrano, uma regiao fria e com tracos culturais bastante diferenciados do litoral. Vem dai o nome da Radio (Cabocla*)e a luta desses trabalhadores para "se amansar e adaptar-se ao jeito diferente de ser do pessoal do litoral".

Antigamente, a radio era instalada na casa de Paulinho, mas pela posicao que ocupava em relacao ao vento, acabava emitindo para a "parte de baixo" do bairro, que nao era populacao que se pretendia atingir. Para atingir melhor a comunidade, a radio mudou de local. Atualmente apenas 5% dos moradores nao aprovam o trabalho da radio.** Nao criar problemas com ninguem da comunidade e uma das preocupacoes da equipe. Para Seu Lori "a credibilidade da radio e fundamental. Nao adianta tentar fazer propaganda, iludir o povo. A Radio tem que falar a verdade. No comeco a gente pensava que falava errado, dai um assessor disse: voces tem que falar do jeito que o povo entende. Nossa linguagem e mais espalhada. Os mais estudados atoram** muito as palavras. O importante e que a gente consiga se comunicar. Outra coisa importante e o humor. A gente precisa primeiro conquistar o publico. Hoje tem pouca gente no bairro que nao gosta. No dia em que faltou luz no bairro, o povo viu a forca que a radio tinha e que ela veio para ficar. Imaginem que a gente ligou o aparelho na bateria do carro e naquela escuridao so tinha a gente transmitindo - nem TV, nem radio normal, nada, nada. Ai o povo viu a forca da Radio Cabocla, que funciona ate sem luz".

E tambem atraves da Radio que os comunicadores dao orientacoes sobre a rede de esgoto: como limpar caixas de gordura, os cuidados com o vaso sanitario, etc. O proximo passo e a participacao maior dos jovens na direcao e programacao. Experiencias comunicativas como esta contribuem para a expressao da cidadania destas comunidades colocadas a margem: fortalecem lacos de solidariedade, atraves da inter-comunicacao de seus problemas e dificuldades, criando um sentido de grupo que reorganiza a exclusao que a sociedade impoe e abre perspectivas de participacao e identidade, como no caso dos jovens; representam uma fonte de informacao e de utilidade publica que o Estado deveria assumir, mas frequentemente nao o faz. **** No dia 25/3 a equipe da Radio foi visitada pela equipe de DIALOGO com objetivo de receber alguns materiais prometidos ,combinar a continuidade do trabalho e ler em conjunto esta ficha DPH. Apos ouvir a leitura seu Lori declarou: "Puxa, voces conseguiram pegar tudo o que a gente disse. Agora eu vou tirar copia dessa ficha e distribuir para algumas pessoas da comunidade. E importante ver que pessoas do estrangeiro valorizam e tem oportunidade de conhecer a experiencia da gente".

Key words

radio


, Brazil, Florianópolis, Santa Catarina

Comments

Fortalece o aprendizado no exercicio democratico da unidade na diversidade - a necessidade de respeitar a intimidade das casas,(pesquisar horarios de aceitacao da emissao), de respeitar aqueles que nao apreciam a radio sem difama-los publicamente (os comunicadores fizeram questao de nao citar quem eram aqueles 5% que nao apreciavam o trabalho), ouvir sugestoes para a programacao e buscar adaptar-se - apesar da origem geografica e cultural diferenciada - sao atitudes que vao alterando e influindo na etica individualista da sociedade atual e vao construindo relacoes humanas e sociais sobre novas bases. Estas micro-experiencias, espalhadas pelos bairros populares em varias cidades do pais, vao construindo um tecido social de integridade dos grupos envolvidos, base fundamental para uma proposta de democratizacao mais profunda que se consolidara nesta construcao etica e filosofica.

Notes

*Caboclo:mescla de branco com indio. No caso, para denominar os nativos do planalto serrano.

** atorar= cortar. (Embora jamais os comunicadores tenham mencionado, observamos que parte destes 5% sao compostos tambem da "parte de baixo" do morro cujos moradores sao bastante abastados em contraste com a "parte de cima" que e a populaçao pobre da comunidade).

Source

Organisation presentation

TRAMONTE, Cristiana, ASSOCIACAO DE MORADORES DO MORRO DA PENITENCIARIA; DIALOGO CULTURA E COMUNICACAO (BRASIL)

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