Só uma reforma agrária eficiente, uma política de distribuição de terra, de assistência técnica e financiera poderiam permitir aos agricultores de desenvolver suas próprias culturas no “polígono da maconha” brasileiro
01 / 2009
Eraldo é agricultor e sindicalista de Jatobá, no sertão pernambucano. Ele lutou desde os anos 80 para assentamento de 6000 famílias no sertão pernambucano. Sua luta ainda não acabou, Eraldo ainda tem um grande caminho a percorrer. Ele vem de uma das áreas onde tem mais conflitos do Brasil, popularmente conhecida como o “polígono da maconha” (uma área de 800 km² que inclui 13 municípios no estado de Pernambuco). Sua luta continua sendo para melhorar a realidade dos moradores da área, que estão dominados pelo medo e pela violência. Eraldo e seus companheiros buscam alternativas sustentáveis para contornar esta realidade. A grande dificuldade é que as autoridades não parecem levar o problema suficientemente a sério. O “polígono da maconha” abastece aproximadamente 80% da produção de maconha no Brasil, e o seu mercado principal é o próprio nordeste e norte do país. As tentativas de erradicar a erva sem um planejamento mais profundo com propostas de outras fontes de renda põe em risco o balanço, não somente econômico, mas também social de toda a região.
Fale um pouco de você. De onde vem?
Sou Eraldo, venho do sertão de Pernambuco, região do São Francisco. Sou agricultor de vários produtos alimentares. Fui coordenador do Polo Sindical por seis anos, incluíndo o momento que conseguimos o assentamento das terras. Agora sou secretário de convivência com o semi- arido, trabalho no programa Um Milhão de Cisternas, que envolve todos os estados que fazem parte da ASA (Articulacão do Semi-árido Nordestino que envolven 11 estados). Também sou coordenador de meio-ambiente da FETAP, além de fazer parte da assessoria de um deputado federal de Pernambuco pelo Partido dos Trabalhadores (PT) na minha região do sertão.
Planta maconha?
Não, eu não planto a maconha – meu vizinho sim que produz. Onde eu moro, conheço de tudo: de plantadores de maconha que são vítimas da situação a plantadores que matam.
Qual foi a sua experiência com o processo de reassentamento?
Eu moro numa área assentada depois da construção da barragem do Itapari. A gente lutou para assentar 6000 familias de agricultores, em um processo de reforma agrária. Conseguimos que todos fossem assentados. Neste processo algumas famílias ficaram encravadas no que hoje é chamado de « Polígono da Maconha ».
Qual é a situação atual da sua comunidade?
Os municípios que estão envolvidos com a produção de maconha se tornam muito violentos. Os latifundiários não são pegos pela policia federal. São os pequenos agricultures de maconha os mais prejudicados pelos projetos de erradicação da maconha. Eles pegam os pequenos plantadores e não aqueles que pagam por estas plantações. Outro problema é que a plantação da maconha também leva à brigas de família pelo poder econômico e político. Como existêm muitas armas envolvidas, a incidência de mortes é bastante alta. Existem na área muitos grupos de extermínio, que em geral estão ligadas com à polícia. Tivemos, faz um tempo, o caso do companheiro Fugêncio Manuel da Silva, que foi o fundador do MAB, assassinado por denunciar o tráfico de drogas na região. Ou seja, se alguém denuncia, eles matam.
Quais são os impactos da erradicação da maconha na sua região? Que tipos de conflitos que isto gera?
Quando existem as batidas de erradicação, um grande problema é que como os produtores e financiadores perdem tudo, muitas vezes vão às ruas tentar recuperar o dinheiro perdido. Assim começa uma onda de assaltos, sequestros e violência. Em um primeiro momento estas campanhas prejudicam os agricultores que dependem deste cultivo, mas em geral a sociedade inteira paga por isto, com o aumento da violência. A qualquer hora você pode ser assaltado, o seu carro levado. É muito perigoso até mesmo dirigir nas estradas. Antes que a maconha chegasse nesta área, toda esta região era muito pacífica.
O que causou esta mudança?
As brigas de família, a questão da seca, a falta de políticas públicas adaptadas às questões da região. Também as mudanças na região, como a construção das barragens, as perdas das terras, tudo isto leva a um problema social e as pessoas começaram a procurar alternativas. Na minha opinião, o grande problema é a proibição da maconha. Se liberasse ela, as coisas mudariam, pois assim ela perderia o valor e seria menos atrativa e não teria tanta repressão.
Como funciona o processo de erradicão da maconha no Brasil?
A polícia federal faz estudos para saber o período que se planta mais. Então nesses períodos eles fazem o corte artesanal, ou seja, eles cortam, arrumam e queimam. Apartir daí começa a faltar dinheiro na região e aumenta a violência.
Que tem que ser feito para mudar esta situacão?
Mas além da liberação, teríamos que buscar alternativas para a agricultura familiar para que o agricultor possa sobreviver sem ter que plantar a maconha, isto resolveria não somente os problemas econômicos da região, mas também os problemas sociais, poderíamos assim, diminuir a violência.
Existem projetos de desenvolvimento de cultivos sustentáveis no sertão pernambucano?
Não, existem idéias, mas nada em concreto.
Qual seria a alternativa?
Seria a reforma agrária. Mas ela somente seria eficiente com uma política de distribuição de terra, de assistência técnica, de crédito para produzir. Não precisamos de assentamento fantasma, precisamos empoderar esta população assentada, dar-lhes os recursos necessários para que eles possam desenvolver seu cultivo. Em muitos casos de reforma agrária, os agricultores acabam deixando a terra, por falta de recursos para cultivar. O que falta é uma política agrária séria.
Que significa o cultivo da maconha para os produtores?
Não é a principal fonte econômica da região, mas é uma fonte de renda bastante importante.
Qual é a cadeia do tráfico ?
O dono da terra contrata os agricultores como assalariado ou fazem acordos que chamamos de meieros, onde o dono da terra dá a terra e compra os insumos e o trabalhador cuida da plantação. No final dividem os lucros, mas é claro, como quem faz a venda é o dono da terra, o produtor não tem controle nenhum sobre sua parcela.
O produtor de maconha é mal visto?
Sim, quem planta maconha é mal visto pela sociedade. Estas pessoas são associadas com assaltos, roubos e assassinatos, o que não é necessariamente o caso.
O uso da maconha já virou parte da cultura local?
Não, porque a maconha é uma substância proibida.
Mas é proibido cultivar também!
Mas mesmo proíbido existe um grande plantio. O uso não faz parte do cotidiano porquê as pessoas têm medo e vêm a maconha como uma substância criminalizada.
Como gostaria de ver a sua comunidade no futuro?
Com a maconha liberada, sem violência e com a possilibidade de cultivos alternativos. Temos que reconhecer o lado bom da maconha, como as propriedades medicinais que ela tem. Parar de discriminar a maconha, para que possamos usar estas avantagens para que todos ganhem, não somente as grandes empresas.
family unit farming, illicit agriculture, violence and drugs
, Brazil, Jatoba
Global Forum of Producers of Crops Declared to be Illicit
Esta entrevista fue realizada durante el I Foro Mundial de Productores de Cultivos Declarados Ilícitos realizado el 29, 30 y 31 de enero 2009 en Barcelona.
Interview
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