A maconha é um plantio atrativo, é de fácil cultivo, não requer muitos insumos, tem muita demanda e não tem muita competição. Infelizmente não existe uma política agrícola, que proporcione alternativa de renda.
01 / 2009
Presentación del entrevistado: Paulo Cesar Pontes Fraga, sociólogo e professor no Departamento de Filosofia e Ciencias Humanas da Universidade Estadual de Santa Cruz (UESC) em Ilhéus, Paulo Cesar Pontes Fraga, vem a muito tempo dedicando sua vida à investigação sobre a violência e os crimes ligados às drogas, além de ter desenvolvido projetos sobre a vida dos trabalhadores rurais que cultivam a maconha.
Paulo, fala um pouco de você e do teu trabalho.
Sou sociólogo e professor da Universidade Estadual de Santa Cruz. Trabalhei durante um tempo com a questão do tráfico de drogas no Rio de Janeiro, em especial com as crianças envolvidas no tráfico. O tema de drogas no Rio é bastante complexo, existe muita violência e o envolvimento de crianças e adolescentes. Para você ter uma ideia, a partir dos 8 anos de idade, a principal causa de morte são os homicidios. Também pelo tema das drogas, nos últimos anos estive trabalhando com a questão do plantio da maconha na região do São Francisco onde está o famoso « Poligono da Maconha. »
Que significa para estes produtores do « Poligono da Maconha » o cultivo da erva?
Em primeiro lugar, é importante dizer que não é a única área do Brasil onde existe o cultivo da maconha, mas é a principal e a mais concentrada, o que facilita as ações políciais. Eu diria que aproximadamente 80% da maconha apreendida pela polícia tem origem no « Poligono da Maconha. » Quanto a produção, é difícil dizer exatamente qual é a proporção que corresponde para esta área, pois a polícia tem somente os dados da apreenção.
Voltando ao tema do cultivo da maconha desta área, isto significa uma oportunidade para o agricultor local melhorar de vida, mas por outro lado ele entra em uma cadeia muito complicada. O produtor muitas vezes tem que ficar por 3 meses no plantio, sem poder abandoná-lo para evitar o roubo. Não é o medo da polícia, porque ela vem eles vão embora, difícilmente eles reagem, problema são os grupos que chegam para roubar, o que causa muitos conflitos. Essa é uma região originalmente conflitiva, sempre existiram muitas brigas entre familias. Eu tenho uma teoria que estes problemas que ocorrem nesta área do país não são causados somente pelo plantio da maconha, mas também se deve muito ao conflito já presente mesmo antes da chegada do cultivo massivo da maconha.
Quem é o mercado consumidor?
Eu estou falando do maior plantio do Brasil, do quarto maior da America Latina, sem considerar o México, mas este plantio é somente suficiente para abastecer 40% do mercado nacional. A produção fica no próprio nordeste. Não vai para o grande mercado nacional, que é Rio-São Paulo. Quem abastece o sul do Brasil é o Paraguai.
Você diz que existem registros do uso da maconha no Brasil desde o século XVIII, quando ela começou a ser marginalizada? A que atribui isto?
No início do século, a maconha e a capoeira começam a ser perseguidas porque eles eram atribuidas com atitudes de decendentes de escravos. Somente nos anos 40 é criada uma lei proibindo o uso da maconha.
Como a maconha chegou nesta região?
Existem registros datando de 1789, onde Richard Burton encontrou aí a planta da maconha. Outros autores relatam também um grande comércio na região na mesma época. Um fato interessante é que quem plantava eram as mulheres, fato parecido com o que ocorria no Rio de Janeiro no começo dos anos 30, onde também eram as mulheres que comercializavam as drogas, por ser considerada algo sem muita importância, pois não era um produto muito atrativo para o mercado.
A imprensa parece dizer que os cultivadores são criminosos. Como funciona a cadeia do tráfico de maconha?
O plantio da maconha é bastante complexo e assume várias formas. Uma forma é a de meieiro, ou seja, o finaciador dá as sementes e os insumos para o agricultor produzir a maconha. Depois o financiador vende a maconha e dá metade deste dinheiro para o agricultor, mas neste processo, o agricultor não tem poder nenhum de decisão, ele não tem a menor ideia de quanto do produto foi vendido. A outra forma de cultivo é o sistema de assalariamento, onde são contratadas pessoas para trabalhar temporariamente as terras. Tem também o pequeno produtor, que cultiva a maconha e depois vende para um intermediario. Neste último caso, o pequeno agricultor compra a semente e planta no seu própio terreno ou no terreno do vizinho. É importante lembrar que no Brasil, o único caso que justifica uma desapropriação para fins de reforma agrária sem indenização é quando o dono da terra é pego com cultivos considerados ilícitos.
Quem é o maior prejudicado com as campanhas de erradicação?
Com certeza é o pequeno agricultor. O que acontece é que esta é uma região bastante castigada. Primeiro, é uma região seca, onde é difícil fazer o plantio tradicional da região, que é da cebola, algodão ou milho, produtos não muito atrativos para o mercado. Outra questão é que muitas pessoas que vivem nesta região foram deslocadas de sua região original para a construção da hidrelétrica de Itaparica. O problema é que esta construção foi feita na época do regime militar onde não havia indenizações e nenhum outro tipo de apoio, nem seque ruma legislação de impacto ambiental. Depois de muita luta por parte das pessoas envolvidas com o polo sindical, hoje estes agricultores já têm suas terras. O que acontece é que não existe uma política agrícola, que proporcione alternativa de renda. A maconha é um plantio atrativo, é de fácil cultivo, não requer muitos insumos, tem muita demanda e não tem muita competição.
Falando com um companheiro da região, ele me contava que quando existe uma ação de erradicação da maconha, o comércio local realmente sente. As pessoas da região não gostam de falar disso, mas é a realidade. A maconha não é a principal atividade econômica, mas é muito importante.
Como funciona o processo de erradição da maconha no Brasil?
Como é uma área com tanta concentração de produção, a polícia federal montou uma delegacia em Salgueiro, que é a maior cidade da região. As ações são determinadas por Brasilia. São feitas as ações mas logo a produção volta. Como me disse um delegado uma vez, este é um trabalho de “enxugar gelo.” E a própria polícia federal reconhece hoje que somente a repressão não é suficiente, são necessárias outras medidas paralelas. No entanto, parece que esta estratégia não mudará para as próximas ações de erradicação.
A repressão não é somente ineficaz, mas também muitas vezes piora a situação. Comente.
A ideia da policía, com estas ações, é quebrar a cadeia produtiva, ou seja, deixar os que eles chamam de financiadores quebrados. O que acontece é que muitas vezes aumenta a violência na região porque estes “financiadores”, em uma tentativa de encontrar diferentes fontes de renda, migram de negócio e acabam aumentando a incidência da violência na região, com assaltos, sequestros e assassinatos. Na minha opinião a repressão só tem elevado à violência e penalizado o produtor. A situação não vai melhorar sem uma política de reforma agrária sensata.
Fale um pouco dos programas de desenvolvimento alternativo da área do polígono da maconha.
Não exitem campanhas de desenvolvimento sustentável na área. Existia um projeto durante o governo de Fernando Henrique Cardoso (FHC) que previa o assentamento e a substituição de plantio. Este projeto de substituição de plantio fracassou. Poucos agricultores foram beneficiados. Não houve um seguimento, no governo Lula e as coisas não mudaram. FHC faz parte agora da Comissão Latino Americana sobre Drogas e Democracia, que até agora não tem demonstrado muito avanço.
O uso da maconha já se tornou parte da cultura da região?
Não, é muito interessante porque eles diferenciam muito bem. Eles se consideram plantadores, trabalhadores, não usuários, existe uma grande distinção destes dois grupos. Existe o preconceito com o usuário. Esta produção começou para venda ao mercado e não para tradição local de uso.
Como gostaria de ver a sua comunidade no futuro? Pode ver alternativa para a situação? O que necessita mudar?
Tudo pasa por uma nova política agrária, através da discriminalização do agricultor e de uma política de distribuição de renda. O complicado para estes trabalhadores é que mesmo o movimento Sem Terra não quer ser vinculado com o cultivo a maconha, ou seja, não lhes apoia. A causa destes produtores é bastante isolada. Deveria exitir uma política de redução de danos, não somente para os usuários mas também para os produtores.
Liberar seria uma solução?
É uma questão complexa, mas sem dúvida deveria existir uma descriminalização do produtor. Deveríamos pensar em políticas de redução de danos, pensar em cultivos e oportunidades distintas e não simplesmente em prender o agricultor.
illicit agriculture, family unit farming, violence and drugs
, Brazil, Ilhéus
Global Forum of Producers of Crops Declared to be Illicit
Esta entrevista fue realizada durante el I Foro Mundial de Productores de Cultivos Declarados Ilícitos realizado el 29, 30 y 31 de enero 2009 en Barcelona.
Interview
Paulo Cesar Pontes Fraga
ALMEDIO - 2, traverse Baussenque, 13002 Marseille, FRANCE Almedio Consultores. Norma 233, Maitencillo. Comuna de Puchuncaví. Va Región, CHILI - Fono: (56)32 277 2231 - Chile - www.almedio.fr - info (@) almedio.fr
CERAI (Centro de Estudios Rurales y de Agricultura) - C/ Del Justicia, nº 1, puerta 8, 46004 Valencia, ESPAÑA - Tel.: +34 963 52 18 78 - Fax: +34 963 52 25 01 - Spain - www.cerai.es - administracion (@) cerai.es