Relato de uma experiência no Ensino Superior no Brasil
Marcio VIEIRA DE SOUZA, Rose Clér Estivalete BECHE, Solange Cristina da Silva
04 / 2009
Historicamente no Brasil, as entidades de atendimento às pessoas cegas e com baixa visão, vêm lutando por sua inclusão nos diferentes níveis de educação, de uma forma comprometida com uma educação para todos.
Dentro dessa perspectiva do direito à inclusão, a Universidade também deve estar adequada às normas de acessibilidade, oportunizando que as pessoas com necessidades educativas especiais exerçam o direito a cidadania. Sensível a essa luta por direito, professores de Educação a Distância, trazem seu olhar sobre a experiência da Universidade Estadual de Santa Catarina - UDESC, no Brasil.
Com base no compromisso pelo direito à inclusão, esta Universidade, constituiu parceria com a Associação Catarinense Para Integração do Cego – ACIC, para responder a reivindicação das pessoas cegas e com baixa visão por educação superior de qualidade. Deste modo, a UDESC ofereceu no período de 2002 a 2006, o Curso de Pedagogia a Distância adaptado às necessidades educativas para uma turma de Florianópolis composta por 21 alunos cegos e com baixa-visão, sendo 13 cegos e 6 com baixa visão e 2 videntes que trabalham com cegos.
A educação a distância é um processo de ensino-aprendizagem que cada vez mais conquista espaço em diversas instituições públicas ou privadas no Brasil, auxiliando e muito a democratização do ensino pelo acesso qualificado a várias pessoas que, por vários motivos, em outras circunstâncias não poderiam estudar no modelo presencial.
Na sua execução, o Curso de Pedagogia a Distância oferecido pelo Centro de Educação a Distância - CEAD/UDESC tem como base a teoria sócio-histórica, desenvolvendo o conhecimento de forma coletiva e interdisciplinar e acontece de forma semi-presencial, ou seja, parte presencial, parte a distância. Os alunos realizam um encontro semanal com o tutor, que faz a mediação entre o aluno e o conhecimento, e um encontro presencial por disciplina, com os professores responsáveis. São, também, utilizados vários recursos tecnológicos de comunicação e informação, tais como telefone, fax, além de materiais impressos (cadernos pedagógicos e instrumentos de avaliação), vídeos pedagógicos e teleconferências.
No desenvolvimento desse Curso, para responder preceitos legais de inclusão e acessibilidade, formou-se na Universidade uma força conjunta entre o Ensino, a Pesquisa e a Extensão, a qual mesmo com a formatura desses alunos continuou por intermédio do Laboratório de Educação Inclusiva - LEdI.
Nessa perspectiva, com o propósito de respeitar a forma de aprendizagem dos alunos cegos e com baixa visão e sua experiência tátil, os recursos e as metodologias utilizadas foram adaptadas de acordo com as especificidades dos mesmos. Constituída de forma heterogênea, nessa turma havia alunos que liam Braille e outros não, outros que tinham facilidade em trabalhar no computador, ainda outros que tinham dificuldades com esse tipo de ferramenta, outros que necessitavam dos materiais ampliados e outros gravados. Considerando essa heterogeneidade e o fato de que o cego e as pessoas com baixa visão desenvolvem, em muito, o recurso auditivo, em seu processo de aprendizagem, todo o material impresso em tinta era disponibilizado em Braille, digitalizado, gravado em fita cassete ou ampliado, de acordo com a necessidade dos alunos. Ainda dentro desta proposta, eram utilizados computadores com sintetizador de voz e ampliador de tela para possibilitar o acesso aos ambientes virtuais. Os filmes sugeridos pelas disciplinas e vídeos pedagógicos eram narrados e contextualizados e, ainda, quando necessário, era lida a legenda. Para oportunizar o acesso às informações necessárias que estavam em sites incompatíveis com os softwares leitores de tela foi feito um site piloto com livros, textos, dissertações e teses digitalizadas, fóruns de discussão, dentre outros. Durante todo o processo de adaptação tivemos a participação dos discentes, do tutor, da tutora, dos professores e dos bolsistas, garantindo assim que as mudanças fossem adequadas ao grupo.
Deste modo, com o uso das tecnologias assistivas, foi possível utilizar materiais do curso de diferentes maneiras, concretizando diversas formas de ensinar e de aprender, além de proporcionar a implementação de metodologias de ensino de acordo com as necessidades educacionais dos alunos, garantindo seu acesso e sua permanência no Ensino Superior e tornando o aprendizado mais significativo. É importante informar que o acesso de alunos com história de deficiência visual à Universidade, em um curso especialmente organizado para recebê-los é, em nosso país, uma ação de vanguarda e a UDESC, ao se propor esse desafio, demonstrou comprometimento e coragem, abrindo espaço para um fazer pedagógico onde a diferença é respeitada e valorizada.
Esta turma de alunos concluiu o Curso em março de 2006, os quais com competência teórica, certamente, qualificarão e poderão propor novos rumos para a educação do Estado de Santa Catarina.
access to education, right to education
A Educação a Distância no Brasil tem crescido de forma vertiginosa na última década. Ainda existem resistências à aplicação das novas tecnologias de comunicação na educação do país, realizada por uma parcela da academia, de educadores brasileiros e da elite que temem a perda da qualidade e do controle do processo educacional. Porém, com a necessidade de ampliação de conhecimento em um país de dimensões continentais, carente de recursos econômicos e sociais, juntamente com o barateamento das novas tecnologias de comunicação e a “sede por saber” de uma grande parcela da população trabalhadora, tem contribuído para o fenômeno de massificação e ampliação da educação a distância no Brasil. Neste processo estão ocorrendo várias experiências ricas em inclusão digital, educacional e principalmente social, como é o caso desta experiência realizada com cegos pela Universidade Estadual de Santa Catarina, relatada pelo olhar desses educadores.
Veja também a ficha: “EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA: UMA EXPERIÊNCIA DE EDUCAÇÃO INCLUSIVA PARA SURDOS NA UNIVERSIDADE brasileira” sobre experiência semelhante.
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