Evoluções promissoras dos agricultores convencionais
06 / 2004
Nesta tarde, participamos de uma atividade notável e interessante. Simplesmente promissora! E isto também é digno de relatar nas crônicas sobre soja. O que, há alguns anos, parecia impossível, agora, de repente, faz parte do possível: agricultores interessados em alternativas para as importações da monocultura de milho e soja.
Blivo, ‘centro especializado em agroecologia’ (1), organizou – em colaboração com De Ploeg [O Arado], em Herselt – uma tarde no campo de demonstração de novas técnicas, principalmente o consórcio de gramíneas-trevo.
‘Gramíneas-trevo’ era uma prática tradicional conhecida dos agricultores até as décadas de 60 e 70 mas que, devido ao ‘progresso’ e em virtude do baixo custo da importação de proteínas, foi considerada ultrapassada. Desde então, Flandres passaria a ser conhecida por seus eternos campos de milho (principalmente como fonte de energia para os animais) associados à importação via marítima de soja e outras fontes de proteínas. Ambas as culturas são, em ambos os lados do oceano, facilmente mecanizáveis desde o plantio, passando pelo combate de pragas e doenças (muito agrotóxico), pela fertilização até a colheita. A paisagem mudou, uma monotonia ‘globalizada’ com planícies cobertas de milho nos países baixos [Holanda e Bélgica] e monocultura da soja em países como o Brasil, Argentina, Paraguai e Bolívia. Anteriormente, os Estados Unidos da América já haviam vivenciado esta tendência uniformizadora com muitas conseqüências ecológicas, culturais e sociais (2).
Somente os agricultores orgânicos ainda utilizavam o consórcio ‘gramíneas-trevo’ em seu plano de rotação. Agora Blivo, depois de ter sido durante dez anos o centro especializado em agricultura orgânica, se rebatizou como ‘centro especializado em agroecologia’. ‘Agroecologia’, um termo que também é utilizado no Brasil e cujo significado é muito mais holístico do que ‘sem química’. Blivo quer colocar o conhecimento da agricultura orgânica moderna em Flandres a serviço do ‘agricultor convencional’ que, gradativamente, está evoluindo para uma agricultura menos intensiva, mas melhor do ponto de vista econômico e ecológico. E foi isto que aconteceu nesta tarde na De Ploeg.
O que está acontecendo? Por que esse interesse repentino dos agricultores?
Uma conjunção de diversos fatores:
1 - A ração concentrada, da qual a soja é um ingrediente importante, tornou-se muito cara nos últimos anos e não tornará a ficar mais barata no curto prazo.
2 - A revisão da política agrícola implica num novo regulamento acerca do bônus pago para plantio de milho a partir de 2005. O bônus por hectare finalmente será extinto.
3 - A Ministra Vera Dua, do governo de coalizão predominantemente liberal, social-democrata e ambientalista – em fim de mandato, propôs – a partir de 1o de janeiro de 2004 – um bônus considerável por hectare para quem converter a lavoura de milho em gramíneas-trevo.
Em colaboração com o engenheiro Wim Govaerts, De Ploeg já está, há mais tempo, realizando experimentos visando uma agricultura mais econômica e também mais ecológica. No ano em curso, 2004, eles tomaram uma medida drástica: converteram 20 hectares para o consórcio milagroso de ‘gramíneas-trevo’. O trevo pode, em associação com bactérias nas raízes, fixar o nitrogênio atmosférico e, além disso, é uma importante fonte de proteínas. Esta capacidade de fixação de nitrogênio, de baixo custo, é comparável àquela da outra leguminosa chamada soja.
Vou poupar-lhe dos detalhes técnicos. Para estes, você pode consultar o dossiê da Blivo e Ronny Aerts, do próprio De Ploeg.
O fato é que raramente vi os agricultores ouvindo com tanta atenção quanto nesta tarde. O percurso ainda é longo e este depoimento terá que ser repetido inúmeras vezes aqui em Flandres (3). Esperamos que o novo governo, que logo tomará posse, também se dê conta disso. Certamente, a receptividade dos agricultores é promissora. Além disso, num campo de demonstração, pode-se ver, sentir e cheirar.
E os agricultores disseram que estava bom. Muito bom.
Alguns dias mais tarde, uma cegonha pousou em De Ploeg.
Será que as novas práticas agrícolas – a Sabedoria do passado – realmente poderão nascer no século XXI?
soy, deforestation, environmental degradation, colonization, ecological disaster, agriculture and stockbreeding
, Brazil
Navios que se cruzam na calada da noite: soja sobre o oceano
Esse texto foi tirado do livro « Navios que se cruzam na calada da noite : soja sobre o oceano » de Luc Vankrunkelsven. Editado pela editora Grafica Popular - CEFURIA en 2006.
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